Mirian Inês da Silva

Obras de arte disponíveis

Mirian Inês da Silva - Sem Título

Sem Título

óleo sobre madeira38 x 31 cm
Mirian Inês da Silva - Sem Título

Sem Título

óleo sobre madeira197845 x 33 cm
Mirian Inês da Silva - Sem Título

Sem Título

óleo sobre madeira198850 x 36 cm
Mirian Inês da Silva - A Preta Mais Doce Que Eu Já Vi

A Preta Mais Doce Que Eu Já Vi

óleo sobre madeira198425 x 40 cm
Mirian Inês da Silva - Sem Título

Sem Título

óleo sobre madeira198228 x 55 cm
Mirian Inês da Silva - Sem Título

Sem Título

óleo sobre madeira198240 x 28 cm
Mirian Inês da Silva - Gabriela Cravo e Canela e o Amor

Gabriela Cravo e Canela e o Amor

óleo sobre madeira198335 x 50 cm
Mirian Inês da Silva - Sem Título

Sem Título

óleo sobre madeira198016 x 30 cm
Mirian Inês da Silva - Nossa Senhora

Nossa Senhora

óleo sobre madeira198413 x 60 cm
Leilão de Arte Online

Biografia

Mirian Inêz da Silva (1948, Trindade/GO - 1996, Rio de Janeiro/RJ)

Mirian Inêz da Silva foi uma pintora que desenvolveu uma trajetória marcada por rupturas e tensões significativas que imprimem maior grau de interesse e sofisticação à sua produção artística. Nascida em Trindade, Goiás, onde cursou a Escola Goiana de Artes Plásticas, ela migrou para o Rio de Janeiro e frequentou o curso de Pintura de Ivan Serpa, realizado no Museu de Arte Moderna (MAM), em 1962-1963. A artista transitou de uma cultura popular do interior brasileiro, das festividades religiosas, mitos orais, ex-votos e folguedos infantis, para uma sociedade metropolitana, permeada pela cultura de massa da música, teatro, cinema e história em quadrinhos.

Mirian iniciou sua carreira como gravadora, sendo reconhecida imediatamente pelo circuito institucional. Participou da Bienal de São Paulo nas edições de 1963 (VII Bienal) e 1967 (IX Bienal), além da 1ª e 2ª Exposição da Jovem Gravura Nacional no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP). Se ela se transferiu de uma cultura popular para uma cultura de massa, em seguida deslocou-se do ambiente noturno das gravuras para o meio solar das pinturas.

As xilogravuras produzidas por Mirian nos anos 60 possuíam grande qualidade técnica, rigor no entalhe e uma adequação orgânica das formas às contingências da madeira. O resultado justificou seu reconhecimento no circuito das artes plásticas do país e no exterior. Com temas ligados à visualidade do cotidiano, como um cachorro, um automóvel, uma mulher na porta de casa, um barco e imagens de santos, a artista criou um universo soturno, no qual a predominância da cor preta com pequenos veios brancos produzia um jogo dialético entre pausa e movimento. A forte influência expressionista, os traços decididos e o tratamento e controle da pouca luz lembravam Oswaldo Goeldi. No início de sua trajetória, Mirian já estabeleceu um conflito ao dar uma expressão noturna ao que ocorre à luz do dia.

A artista abandonou as xilogravuras no final dos anos 60 e, em 1970, realizou sua primeira mostra de pinturas na Loja Residência, no Rio de Janeiro. Assim como foi uma premiada gravadora, seu desempenho como pintora também foi notável, tanto que em 1983, um momento profícuo de sua produção, fez uma exposição na Galeria Bonino, no Rio de Janeiro.

Uma matéria do jornal O Popular, de Goiânia, do dia 20 de dezembro de 1983, afirmou seu destaque no cenário nacional e transcreveu as opiniões da artista: "Para mim pintar é vida. Pinto o que amo e sinto no coração. O povo para mim, o Brasil, são uma atração grande demais. Curto ouvir causos, música popular e o mais importante, estou muito com gente, mas não importa a escala social. Minha pintura deve muito aos grandes mestres que tive em Goiás. E no Rio, o Ivan Serpa".

Esse depoimento permite destacar os temas tratados na pintura (e nas gravuras) de Mirian: aspectos da sociabilidade no meio rural e na cidade, a cultura popular, a cultura de massa e as representações religiosas e míticas. A artista volta-se ao que é vivo, festivo, pulsante e corriqueiro. Percebe-se em sua obra a preocupação com uma certa brasilidade, buscada na natureza e na cultura. Em suas pinturas esses dois aspectos são representados pelas vegetações, pelo mar, pelos circos, festas e brincadeiras infantis.

Ao passar da gravura para a pintura, Mirian recuperou a luz solar, escondida que estava no escuro das suas xilogravuras. Nas suas pinturas de fundo branco, a pequena forma redonda e alaranjada do sol insiste em aparecer com frequência. Há, inclusive, uma pintura na qual no lado esquerdo há uma lua crescente e no lado direito oposto, um sol luminoso.

As pinturas de Mirian apresentam-se em composições singelas e repetitivas, sobre madeira recortada, herança da xilogravura. Entretanto, essa aparente simplicidade merece análise, a partir de uma abordagem interna à obra. Não bastassem as tensões já anotadas, tanto na trajetória quanto na linguagem da artista, podem verificar-se novos conflitos, escondidos na superfície aparentemente calma das suas pinturas.

De imediato, destaca-se uma tensão que se dá permanentemente nas pinturas de Mirian: a convivência entre uma ordem abstrata e geométrica e uma ordem figurativa. Todas as pinturas da artista possuem uma estrutura geométrica nas bordas do quadro (inferior, superior e laterais) e um amplo espaço branco disponível à narrativa no centro do quadro. Assim, suas obras são constituídas por duas ordens pictóricas, dois territórios visuais, que se encontram lado a lado, a abstração geométrica das bordas e o espaço branco para a elaboração figurativa.

Nesse sentido, Mirian é mais do que uma artista figurativa, sendo conveniente enfatizar seu fazer geométrico sensível, próximo da arte concreta. Ao se constatar visualmente a presença dessas duas ordens simultâneas, desses dois movimentos de formas e cores, percebe-se que eles se complementam mutuamente e, também, se distanciam, negam-se. Enquanto composição espacial, uma parte necessita da outra; enquanto discussão de linguagem, cada qual coloca problematizações específicas e diferenciadas. Nas pinturas de Mirian, esse conflito não se resolve, mas torna-se um elemento fundamental para compreender a particularidade e sofisticação estética dos seus trabalhos.

As quatro faixas (que podem se desdobrar em outras) são livres de representação, significam por si só, mesmo que possam remeter à ideia de janelas, cortinas ou molduras. Existem algumas pinturas com cortinas encostadas nas faixas, diferenciando uma da outra. Então, as faixas não são equivalências, nem representações, são formas autônomas e permanentes que imprimem uma determinada estruturação da pintura, compondo a sua totalidade.

Como grande colorista, a artista dá um tratamento de cor diferente para essas duas ordens estéticas. As faixas são feitas em cores escuras e tons baixos, enquanto as formas/figurações do plano branco possuem cores claras, vibrantes e brilhantes. Além disso, as faixas atraem e retêm a luz das cores, enquanto as formas/figuras do plano branco emitem e expulsam a luz. Mirian está tratando de duas esferas distintas e opostas que estruturam conflituosamente os seus quadros.

Para efeito de aproximações, percebe-se que a paleta de cores das faixas geométricas remete a Iberê Camargo, enquanto as cores utilizadas para a elaboração do plano figurativo – onde cores brilhantes contrastam com o fundo – lembram Anita Malfatti e Tarsila do Amaral. Além disso, Mirian parece retirar de Tarsila os volumes e traçados curvos e sintéticos utilizados para compor as suas vegetações, morros, nuvens e ondas do mar.

Quando a narrativa no espaço branco ocorre em ambiente externo, a artista coloca dois pequenos semicírculos azuis nos cantos superiores da pintura, simbolizando o céu. Dessa forma, algumas composições lembram um nicho ou uma arquitetura bizantina que acolhe as personagens da narração, criando um ambiente de espiritualidade.

Pode-se pensar o uso das faixas como um esforço construtivo para compor as pinturas, valorizando o plano e a ausência da perspectiva. Tanto as faixas quanto as figurações encontram-se no mesmo plano pictórico; são elaboradas com controle e com justa definição de fronteiras entre formas e cores. Por isso, sem a presença de um ponto de fuga, as imagens (desenhadas com aparente simplicidade) geralmente são frontais, como também são as faixas.

A especificidade da linguagem de Mirian caminha numa direção construtiva. Assim, pode-se afirmar a existência de uma unidade híbrida, de convivência entre diferentes, imprimindo particularidade à sua obra. A dimensão geométrica pode ser reforçada ao se observar que grande parte das pinturas da artista se faz por espaços horizontais sobrepostos.

Diante da imobilidade das faixas e do fundo branco, nas cenas criadas por Mirian os personagens estão sempre em ação. A artista capta um momento de acontecimentos dinâmicos: passeios, festas, namoros, atos religiosos, danças, mesas de bar e espetáculos diversos. Há um certo aspecto trágico na constatação de que o movimento fugaz, passageiro, mutável, da dimensão figurativa ocorre junto a um mundo inflexível, rígido e permanente da dimensão geométrica.

Na sociedade e na estrutura da pintura de Mirian existem conflitos agônicos, irredutíveis. Talvez se possa pensar que suas pinturas não expressam apenas a alegria de viver ou a celebração da vida. Por que não considerar, sob uma perspectiva trágica, que a artista elabora sua transparente, vazada e flutuante figuração, como um desejo de vida plena, na constatação ou suspeita de que estruturas fortes e permanentes podem ser obstáculos ou limites ao bom encaminhamento do que ocorre no cotidiano?

A obra de Mirian é permeada por alguns paradoxos. Um deles tem como centro a "mulher de vestido vermelho". Assim como é numerosa a série de pinturas de cunho religioso, também é destacável a questão do feminino. A artista, várias vezes, cruza os temas da religiosidade e da sensualidade, como ocorre nas pinturas que representam Adão e Eva, nus e sensuais, como mostra a pintura "Adão e Eva" (1992). Ou então insiste no tema do encontro de casais ("Gabriela e Nassif" [1978] e "Casal" [1995]).

Essa questão torna-se potente quando Mirian apresenta a mulher de vestido vermelho, ostensivamente presente em cenas de bares, danças e festejos. Veja-se a pintura "Geni e o homem do Zepelim" (1981), na qual a mulher de vestido vermelho coloca-se numa posição decidida e altiva, desafiadora e disposta ao enfrentamento contra o homem e a máquina.

A aproximação entre os trabalhos de Mirian e o teatro pode ser reforçada ao se observar que as faces das figuras pintadas pela artista parecem máscaras teatrais. Seres humanos e animais portam uma máscara congelada e repetida, com muita maquiagem, bochechas rosadas e lábios destacados. Suas pinturas apresentam o mundo acontecendo em uma boca de cena. A ação figurativa dada no espaço branco e luminoso não é real, mas sim uma representação possível. O clima é onírico, flutuante e lúdico – tudo é desejo buscando expressão visual.

A partir do conflito entre ordem abstrata geométrica e ordem figurativa, a obra de Mirian pode ser entendida como uma dimensão intermediária para se pensar a arte e a vida. Suas pinturas permitem problematizar a linguagem na arte e, simultaneamente, passar a visão de uma observadora da vida das pessoas e da sociedade brasileira.

Veja também