Karl Heinz Hansen (Hamburgo, Alemanha 1915 - São Félix BA 1978)
Gravador, escultor, pintor, ilustrador, poeta, escritor, cineasta e professor.
Entre 1936 e 1945, serve como soldado na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), e atua como ilustrador de histórias infantis. Realiza suas primeiras xilogravuras entre 1946 e 1948. Emigra para o Brasil em 1950, instala-se em São Paulo e trabalha para a Companhia Melhoramentos até 1955, ano em que se muda para Salvador. Em 1957, ilustra a publicação Flor de São Miguel, com textos de Jorge Amado (1912-2001), Vinicius de Moraes (1913-1980) e de sua autoria. No ano seguinte realiza ilustrações para Navio Negreiro, de Castro Alves (1847-1871). Retorna à Alemanha em 1959, lá permanecendo até 1963, enquanto trabalha no ateliê de gravura fundado por ele mesmo no castelo Tittmoning. Vive na Etiópia entre 1963 e 1966, onde ajuda a estabelecer a Escola de Belas Artes da cidade de Addis Abeba. Retorna a Salvador e naturaliza-se, adotando o nome artístico de Hansen Bahia. Torna-se professor de artes gráficas da Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia (UFBA), em 1967. Muda-se para São Félix, Bahia, em 1970, e lá reside até seu falecimento, em 1978. Dois anos antes de sua morte, doa em testamento sua produção artística para a cidade de Cachoeira, Bahia, onde é criada a Fundação Hansen Bahia, que recebe seu acervo artístico de xilogravuras, matrizes, livros, pinturas, prensas e ferramentas de trabalho.
Comentário Crítico
Em 1957, Hansen Bahia realiza uma série de xilogravuras para ilustrar a publicação Flor de São Miguel, que conta com textos de sua autoria, de Jorge Amado e Vinicius de Moraes. Nessas xilogravuras, o artista alemão, radicado na Bahia, explora o tema da prostituição, com base em observação no centro histórico de Salvador. Em várias dessas estampas, Hansen trabalha com mais uma cor além do preto e do branco (azul, marrom, vermelho), ressaltando o aspecto dramático das cenas e figuras de um universo ao mesmo tempo lúdico e precário.
Essas cenas são ambientadas no interior dos prostíbulos ou próximas a suas fachadas, revelando o quarto azul da mãe-meretriz, a moça negra já nua esperando o cliente na janela, a calçada movimentada com o vai e vem dos frequentadores. O talho tosco e o traço irregular, quando passados à estampa, conferem-lhe um aspecto desgastado, construindo um mundo de superfícies carcomidas habitado por criaturas cujos corpos arredondados exibem em sua pele as ranhuras da madeira. O talho, aliás, serve tanto para delinear o contorno dos corpos quanto para formar a superfície estriada de uma coxa ou uma face, amalgamando-os ao chão de velhas tábuas, às camas de cabeceiras arranhadas, às paredes sulcadas, dotando a imagem de um aspecto visualmente homogêneo, como se as pessoas e coisas ali vistas não fossem muito diferentes umas das outras, uma vez que partilham a mesma origem, a mesma lida e o mesmo destino.
Críticas
"Eis que a Bahia tem esse mistério, essa grandeza sem limites, esse óleo de luar que escorre pelas noites, sobre os homens, ninguém pode a ele resistir. Aqueles são realmente artistas, chegados das partes mais distantes do Mundo, por vezes displicentes, por vezes tristes, por vezes cansados. Sei de muitos conquistados assim pela Bahia, brasileiros de outras plagas, estrangeiros vindos através dos mares. O último de que tenho notícia é o alemão Hansen, artista dos melhores que já pisaram o solo baiano. (...)
Mestre da gravura, pintor, escultor, desenhista, famoso e indiscutível, Hansen Bahia tudo deixou para trás e partiu conduzindo a cruz de Cristo".
Jorge Amado
BRITO, Reynaldo de. Hansen Bahia: 60 anos de vitalidade e criação. A Tarde, Bahia, n. 12, abr. 1975.
"Karl Heinz Hansen emigrou para o Brasil no fim de 1948 e lá tem residido continuamente, exceto entre 1963 e 1966, quando viveu em Addis Abeba, na Etiópia, a convite do imperador, onde ajudou a estabelecer a Escola de Belas Artes. Tornou-se cidadão brasileiro e brasileiro se considera, baiano mais exatamente. No mais, é conhecido profissionalmente como Hansen Bahia. Sua obra se vale amiúde e com intensidade dos temas baianos. (...) As xilogravuras de Hansen Bahia têm sido exibidas em diversos países da Europa, da América Latina e nos Estados Unidos. É provável que entre suas obras as mais conhecidas sejam os livros de gravuras ou xilografias inspiradas em temas bíblicos e nos escritos de Jorge Amado, Castro Alves, Luís Viana Filho e François Villon, entre outros. Dois de seus livros foram contemplados com o Prêmio do Livro Alemão, como os livros mais belos do ano. Recentemente completou outro livro de xilogravuras, a ser publicado em breve. A convite do governo a Argentina, participou da 2ª Bienal Internacional de Artes Gráficas, em Buenos Aires, em 1970. Naquela ocasião, mereceu o Prêmio América, pelo ´melhor trabalho com espírito americano'. Em janeiro de 1971, Hansen Bahia teve grande mostra individual em Brasília, patrocinada pelo Ministério das Relações Exteriores; nessa oportunidade, presenteou o Itamaraty com a xilogravura Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse, posteriormente exibida no Festival Dürer (...). Quando Hansen Bahia chegou ao Brasil, sua formação técnica e artística já era bastante completa, apesar de jovem. Mas foi no Brasil que ele floresceu; foi na Bahia que ele desabrochou. (...) Na Bahia encontrou paz, doçura, sensualidade e alegria de viver. Do encontro de sua herança adquirida no país de origem com a revelação e o potencial encontrados em sua terra de adoção, nasceria uma arte matizada, rica, povoada de mulatas, embebidas pela natureza, fortalecida por pescadores e homens do povo, iluminada pelo Sol, diferenciada por uma técnica feita de virtuosidade cada vez maior. E quando chegou a hora de ele reinterpretar os mitos gregos e os temas bíblicos, para lá convergiu a totalidade de sua experiência de vida e de sua bagagem artística, plasmando em várias de suas séries de gravuras o humanismo de quem vê a morte e o apocalipse na figura de Hitler, o Mal sem redenção, e na beleza da vida e na incondicionalidade do amor, a única possibilidade de redenção. Embora exímio em várias técnicas, foi na xilogravura que encontrou a melhor adequação para o conteúdo de seus temas, e nela tornou-se um mestre".
José Neistein
NEISTEIN, José. A Feitura das Artes. São Paulo: Perspectiva, 1981. p. 87-88
"A leveza das figuras de Calazans Neto e seu humor de cordel na ilustração de Jorge Amado têm, como contrapartida, a xilogravura dramática de Karl Heinz Hansen, que é, antes de mais nada, ilustrador: tendo trabalhado na Companhia Melhoramentos de São Paulo, onde escrevera e ilustrara histórias infantis, Hansen mudou-se para a Bahia, onde inclui o topônimo em seu nome de pessoa. Incorpou, então, em suas gravuras cenas e figuras que, expondo, embora a Bahia, generalizam-se: em suas xilogravuras, vêem-se prostitutas, pescadores, negros, que se cenarizam e estilizam alheios à cor local, na ocorrência, baiana, pois podem produzir-se em qualquer lugar. Sendo os cenários exíguos, sua estilização, como as extremidades dos corpos, são básicos para a comoção buscada. Contribuem para o patético os contornos marcados e a luz, que ora constrói o entorno da figura, ora se faz assinalar por ranhuras agressivas e tópicas. Não é casual que a dramaticidade de Hansen Bahia encontre, mantidas, as diferenças estilísticas, a de Lasar Segall".
Leon Kossovitch e Mayra Laudanna
GRAVURA: arte brasileira do século XX. São Paulo: Itaú Cultural: Cosac & Naify, 2000. p. 28.
Exposições Individuais
1950 - São Paulo SP - Individual, no Masp
1952 - Rio de Janeiro RJ - Individual, no MNBA
1953 - Rio de Janeiro RJ - Individual, no Masp
1955 - São Paulo SP - Individual, no MAM/SP
1956 - São Paulo SP - Hansen Bahia, no MAM/SP
1964 - São Paulo SP - Individual, no MAM/SP
1966 - São Paulo SP - Individual, no Masp
1971 - Brasília DF - Individual
1975 - São Paulo SP - Hansen Bahia, no MAB/Faap
Exposições Coletivas
1951 - São Paulo SP - 1ª Bienal Internacional de São Paulo, no Pavilhão do Trianon
1952 - São Paulo SP - 2º Salão Paulista de Arte Moderna, na Galeria Prestes Maia
1953 - São Paulo SP - 2ª Bienal Internacional de São Paulo, no Pavilhão dos Estados
1954 - São Paulo SP - 3º Salão Paulista de Arte Moderna, na Galeria Prestes Maia
1955 - São Paulo SP - 3ª Bienal Internacional de São Paulo, no Pavilhão das Nações
1955 - São Paulo SP - 4º Salão Paulista de Arte Moderna, na Galeria Prestes Maia
1957 - São Paulo SP - 4ª Bienal Internacional de São Paulo, no Pavilhão Ciccilo Matarazzo Sobrinho
1957 - São Paulo SP - Artistas da Bahia, no MAM/SP
1959 - São Paulo SP - 5ª Bienal Internacional de São Paulo, no Pavilhão Ciccilo Matarazzo Sobrinho
1961 - São Paulo SP - 6ª Bienal Internacional de São Paulo, no Pavilhão Ciccilo Matarazzo Sobrinho
1969 - São Paulo SP - 1º Panorama de Arte Atual Brasileira, no MAM/SP
1970 - Buenos Aires (Argentina) - 2ª Bienal Internacional de Artes Gráficas - Prêmio América
1970 - São Paulo SP - A Gravura Brasileira, no Paço das Artes
Exposições Póstumas
1984 - Curitiba PR - A Xilogravura na História da Arte Brasileira, na Casa Romário Martins
1984 - Rio de Janeiro RJ - A Xilogravura na História da Arte Brasileira, na Funarte. Galeria Sérgio Milliet
1985 - Rio de Janeiro RJ - 8º Salão Nacional de Artes Plásticas, no MAM/RJ
1985 - São Paulo SP - 18ª Bienal Internacional de São Paulo, na Fundação Bienal
1992 - Rio de Janeiro RJ - Gravura de Arte no Brasil: proposta para um mapeamento, no CCBB
1993 - João Pessoa PB - Xilogravura: do cordel à galeria, na Fundação Espaço Cultural da Paraíba
1994 - São Paulo SP - Gravuras: sutilezas e mistérios, técnicas de impressão, na Pinacoteca do Estado
1994 - São Paulo SP - Xilogravura: do cordel à galeria, na Companhia do Metropolitano de São Paulo
1994 - São Paulo SP - Xilogravura: do cordel à galeria, no Masp
1998 - Salvador BA - Hansen Bahia: 20 anos depois, na Galeria Solar Ferrão
1998 - São Félix BA - 4ª Bienal do Recôncavo, no Centro Cultural Dannemann
1999 - Salvador BA - Hansen Bahia, na Galeria do ICBA
1999 - Salvador BA - Lukian: o diálogo das heteras, na Galeria Solar Ferrão
2000 - Salvador BA - A Ópera dos Três Vinténs, no MAM/BA
2000 - Salvador BA - Hansen Viver Bahia, na Galeria Solar Ferrão
2000 - São Paulo SP - Hansen Bahia: retrospectiva, no Conjunto Cultural da Caixa
2000 - São Paulo SP - Investigações. A Gravura Brasileira, no Itaú Cultural
2001 - Brasília DF - Investigações. A Gravura Brasileira, na Galeria Itaú Cultural
2001 - Penápolis SP - Investigações. A Gravura Brasileira, na Galeria Itaú Cultural
2003 - São Paulo SP - Entre Aberto, na Gravura Brasileira
Fonte: Itaú Cultural