Bernard Bouts (1909 - 1986)
Bernard Bouts foi pintor e filósofo da arte. Nasceu em 2 de dezembro de 1909, em Versalhes, França, descendente de uma linhagem flamenga que incluía o pintor Thierry Bouts. Passou a infância na Bretanha, onde despertou seu fascínio pelo mar. Iniciou seus estudos artísticos em 1929 com Henri Charlier, de quem assimilou fundamentos como a eliminação do claro-escuro e a busca por uma rítmica livre na pintura, princípios aos quais permaneceu fiel ao longo de toda a vida.
Deixou a França em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, mudando-se para a Argentina com a esposa e os filhos. Realizou sua primeira exposição individual em Buenos Aires em 1943, voltando a expor na cidade em 1951, na Galeria Wildenstein. Viajou por diversos países da América do Sul, ampliando suas referências visuais e cromáticas.
Em 1954, iniciou a navegação com o veleiro Andariego. Em 1961, adquiriu a escuna Cisne, na Bahia, onde passou a viver e pintar a bordo por dez anos, percorrendo toda a costa brasileira. Grande parte de sua obra foi dedicada às marinhas, refletindo sua profunda ligação com o mar. Manteve-se à margem das vanguardas e do mercado de arte, fiel à sua visão estética, inspirada em tradições antigas como a arte egípcia, bizantina e medieval. Faleceu mantendo-se sempre um artista independente e inconformista.
O artista
Durante três anos, Bouts frequentou e ministrou na França cursos de filosofia da arte.
Procurou desse modo encontrar seu próprio caminho, do qual não se afasta. Só o grande artista paga o alto preço dessa intransigente fidelidade a si mesmo, até porque só ele, pacientemente, harmoniosamente, é capaz de aliar os mais sólidos conhecimentos artesanais e técnicos à mais requintada linguagem pictórica. Compreende-se assim que, desde cedo - a partir de seu decisivo encontro com Henri Charlier - Bouts se tenha revelado dócil ao apelo dos essenciais e estritos valores da pintura e da escultura, embora também atento a seus elementos e aspectos decorativos que merecem sempre ser considerados, pois ao contrário do que alguns pensam, não diminuem os méritos de nenhum trabalho artístico, precisamente por serem oriundos da própria beleza e encantamento plásticos de toda autêntica obra de arte. Seria também importante observar que jamais seria um artísta engajado! Tanto em relação à política, como a esta ou àquela corrente da suposta vanguarda de seus tempos de mocidade ou da precária vanguarda atual, Bouts se manteve sempre um artista independente. É como homem - não como artista que teve posições políticas, filosóficas ou religiosas. Ninguém o arredava da trilha que escolheu, desdenhoso ao extremo não só de capelas artísticas, de apreciações e juízos críticos, como de exposições e salões oficiais. Foi inconformista por natureza. Não se interessava nunca pelo que o público pudesse pensar a respeito da arte, tanto a dos outros como a sua. Permaneceu até o final de sua vida fiel ao itinerário que escolheu na juventude.
Bernard Bouts sempre esteve em uma posição solitária em relação à pintura e às outras artes visuais.
Ele se insurgiu com ironia ou desprezo contra as modas e as escolas, contra todos os ismos e movimentos artísticos que se desenrolaram no velho mundo, principalmente ao longo deste século. Combateu a Escola de Paris e as mudanças incessantes, sucessivas, massacrantes - e para ele de todo injustificáveis da arte submetida à tirania do mercado na sociedade de consumo. É sempre instigante, nessa matéria, nadar ou, como na caso de Bouts, navegar contra maré. Em vez de buscar inspiração no cubismo, no surrealismo e em outras manifestações da arte conteporânea, para exercer seu admirável poder criador ele prefere voltar-se para a pintura rupestre, para as formas dos cântaros antigos, para as realizações dos artistas da velha China, do Egito, da Grécia arcaica, de Bizâncio, da Idade Média do século XIII e de outros tempos. Este é de fato um comportamento sui-generis. Tem o propósito de retornar às constantes dos períodos, para ele, decisivos da história da arte, levado pelas características de seu espírito e por estudos especializados. Bernard Bouts não via sentido em se preocupar com períodos ou fases distintas em sua obra , pois sempre trabalhou num mesmo sentido. Não era raro fazer simultaneamente três quadros de temáticas diferentes e em técnicas diversas.
A relação com o mar
Para que possamos compreender melhor a vida e a obra de Bernard Bouts devemos conhecer um pouco de sua ligação com o mar, cuja vida muito lhe marcou desde a sua juventude na Bretanha , navegando ao longo de suas praias. Ele amava a civilização marítima e toda a sua cultura oriunda do tempo dos fenícios, tornado-se para Bouts uma segunda profissão, complementando e enriquecendo sua Arte e seu pensamento.
Na América do Sul, Bouts começou a navegar em 1954 com o veleiro chamado o Andariego. Ele gostava de velejar, com a sua esposa e o seu filho (sua filha já falecera aos 7anos de idade em Buenos Aires), ao léu da aventura ou dos ventos, que sopram sempre caprichosamente. Em seu texto manuscrito, encontrado no seu livro, Bouts compara sua prática de navegante a seus trabalhos de pintor. Equipara assim a atividade do velejador ao seu ofício de artísta plástico. O confronto é sugestivo e não deixa de ter singularidade em nosso país. Esta é outra das originalidades do pintor.
A permanência da família Bouts na Argentina foi interrompida em 1954. Esta parte para o Brasil a bordo de seu barco o Andariego dando início a inúmeras viagens pela América do Sul.
Em visita à Bahia Bernard Bouts se depara com uma escuna que o deixa fascinado. Ele pediu a um amigo que a adquirisse para ele, se por acaso ela fosse posta à venda, em sua ausência. Fora feliz, pois logo ela ficara disponível. Foi assim que em 1º fevereiro de 1961 ele comprou o CISNE, a sua bela escuna, na qual viveu e pintou. Trabalhou e percorreu desse modo, durante dez anos, toda a enorme costa do Brasil, desde o Oiapoque ao Chuí. Desta vida no mar, Bouts destina às marinhas um dos principais objetos de seu trabalho.
Fonte: Site do artista