Aleijadinho

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Biografia

Aleijadinho (Ouro Preto MG 1730 - idem 1814)

Aleijadinho foi escultor, arquiteto e entalhador, reconhecido como o mais importante artista brasileiro do período colonial. Apesar de sua relevância, alguns aspectos de sua vida permanecem obscuros, como a data de nascimento. Registros indicam 29 de agosto de 1730, mas um documento da Paróquia de Antônio Dias, em Ouro Preto, sugere que Aleijadinho teria falecido em 18 de novembro de 1814, aos 76 anos, o que apontaria para 1738 como data de nascimento. Antônio Francisco Lisboa nasceu bastardo e escravizado, sendo filho natural do arquiteto português Manoel Francisco Lisboa e de uma escrava africana.

Aleijadinho foi um artista cuja formação inicial permanece incerta. É provável que tenha recebido apenas instrução básica em primeiras letras e talvez algumas aulas de latim. Sua formação artística, contudo, teria ocorrido com o pai, arquiteto de prestígio, e com João Gomes Batista, pintor e desenhista da Casa de Fundição de Vila Rica. Biógrafos também apontam possíveis influências de Francisco Xavier de Brito e José Coelho Noronha, além do contato com gravuras europeias, principalmente de santos germânicos, que se refletem no estilo singular das esculturas de Aleijadinho.

Aleijadinho foi mencionado pela primeira vez em 1766, ao receber a encomenda do projeto da Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto. Até então, sua vida era marcada por saúde, sociabilidade e prazer pelas artes e festas populares. Em 1767, perdeu o pai, Manoel Francisco Lisboa, também renomado arquiteto. Em 1772, ingressou na Irmandade de São José e, em 1775, teve um filho no Rio de Janeiro, batizado como Manoel Francisco Lisboa, que seguiu a carreira artística e deu continuidade ao legado da família.

Aleijadinho foi profundamente marcado pelo ano de 1777, quando adoeceu gravemente. Sua obra, antes marcada por vitalidade, tornou-se mais densa e melancólica. Documentos confirmam que, devido às limitações físicas, precisava ser transportado para trabalhar. Pesquisas médicas indicam que sofria de lepra nervosa, doença que causou deformidades, mas não comprometeu órgãos internos, permitindo-lhe viver e criar por quase quatro décadas após o início dos sintomas.

Aleijadinho foi requisitado em diversas vilas coloniais mineiras a partir da década de 1780, tornando-se referência obrigatória em grandes obras sacras. Em Sabará, por exemplo, trabalhou na ornamentação da Igreja da Ordem Terceira do Carmo. Sua fama se consolidou a partir de 1790, quando passou a receber encomendas sucessivas, disputadas entre cidades.

Aleijadinho deixou vasta produção artística, confirmada por documentos originais, como recibos assinados e registros de despesas. Grande parte desse acervo permanece em arquivos de igrejas onde atuou. Seu ateliê, composto por diversos oficiais, teve papel fundamental na execução de obras, como os Passos de Congonhas. Esses colaboradores realizavam acabamentos e, em alguns casos, peças inteiras, ampliando o alcance da produção do mestre.

Aleijadinho realizou em Congonhas, entre 1796 e 1805, o auge de sua arte barroca. Ali produziu 66 esculturas em cedro retratando os Passos da Paixão de Cristo e, em pedra-sabão, esculpiu os célebres 12 Profetas. Esse conjunto monumental consolidou Aleijadinho como gênio do barroco brasileiro e responsável pela criação do maior acervo escultórico barroco ao ar livre no mundo.

Momento histórico em que viveu Lisboa

Aleijadinho foi testemunha das transformações políticas, sociais e econômicas que marcaram o Brasil colonial no século XVIII. Nos primeiros anos de vida, conheceu relatos sobre as violências praticadas pelo governador português D. Pedro de Almeida, Conde de Assumar, que determinou a destruição das choupanas de adobe no Morro de Ouro Podre, onde se refugiavam escravizados de Pascoal da Silva Guimarães.

Aleijadinho, ainda adolescente, vivenciou o clima de rivalidade entre taubateanos e outros paulistas, além de sentir os reflexos da rigidez do governador D. Luiz da Cunha Menezes. Também acompanhou as memórias das sangrentas lutas dos paulistas contra os emboabas, conflitos que marcaram a história da mineração no período colonial.

Aleijadinho esteve próximo do crescente descontentamento popular diante da cobrança dos “quintos”, impostos obrigatórios enviados ao Reino de Portugal. Essa condição se tornava cada vez mais insuportável à medida que os veios auríferos das Minas Gerais se esgotavam. Os interesses da metrópole nas jazidas levaram, inclusive, à transferência do Governo Geral para o Rio de Janeiro, movimento que redefiniu a economia brasileira, deslocando seu eixo do sul para o centro da Colônia.

Aleijadinho presenciou também a intensa atuação do clero, já que sacerdotes de diferentes ordens obtinham licença para arrecadar ouro nas Minas, financiando a construção de conventos erguidos com mão de obra escravizada. Apesar de descontentamentos, roubos, crimes, disputas entre mineradores, aventureiros e religiosos, a região prosperou. Vila Rica de Nossa Senhora do Pilar de Albuquerque — nome dado pelo governador Antônio de Albuquerque ao território recém-descoberto — tornou-se símbolo da riqueza aurífera e cenário onde se consolidou a trajetória de Aleijadinho.

"Aleijadinho foi invenção do governo Vargas"

Aleijadinho foi apontado pelo pesquisador paulista Dalton Sala como uma possível invenção do governo Getúlio Vargas. Segundo Sala, o mestre do barroco seria um mito criado para a construção da identidade nacional: um protótipo do brasileiro mestiço, marcado pela dor, pela doença e pela superação através da criatividade.

Aleijadinho, afirma o pesquisador, nunca teve autoria comprovada textualmente sobre todas as obras que lhe foram atribuídas. Para ele, a consolidação do mito está ligada à necessidade política e ideológica da ditadura Vargas. Criado logo após o golpe de 1937, o SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) teria a função de colaborar na construção de uma identidade cultural para o Brasil.

Aleijadinho foi, portanto, colocado ao lado de Tiradentes como símbolo de autonomia: cultural, no caso do artista, e política, no caso do inconfidente. Dalton Sala ressalta que o mito já existia antes de Vargas, mas foi amplamente aproveitado pelo Estado Novo.

Aleijadinho aparece em registros de 1858, quando Rodrigo José Ferreira Bretas publicou no Correio Oficial de Minas ter encontrado um livro datado de 1790 com a história de Antônio Francisco Lisboa. No entanto, o chamado Livro de registros de fatos notáveis da cidade de Mariana jamais foi localizado, levantando dúvidas sobre sua autenticidade.

Aleijadinho teve ainda sua autoria reforçada por pareceres de especialistas. Sala aponta que, em 1989, o historiador de arte Germain Bazin revelou ter sido pressionado por Rodrigo Melo Franco de Andrade, ex-presidente do SPHAN, e pelo arquiteto Lúcio Costa a atribuir ao artista obras que não tinham comprovação definitiva.

Jair Ratter

Acróstico prova a existência do Santo-bruxo, tombado

Aleijadinho foi além do rococó e dos motivos do barroco mineiro, transformando a iconografia sacra em símbolos carregados de ironia e significados profanos. Sua obra revela uma dimensão que ultrapassa a estética, sugerindo mensagens ocultas que intrigam estudiosos e admiradores.

Aleijadinho, segundo registros, chegou a ser alvo de tentativas de apagamento. No início do século XX, o padre Júlio Engrácia, administrador do Santuário de Congonhas do Campo, tentou eliminar referências às esculturas do mestre, o que reforça a relevância e a polêmica em torno de sua autoria.

Aleijadinho teria respondido a céticos e detratores com um enigma artístico: um acróstico. As iniciais dos Profetas Abdias, Baruc, Ezequiel, Jonas, Jeremias, Amós, Daniel, Joel, Naum, Habacuc, Oséias e Isaías formam o nome pelo qual ficou conhecido — Aleijadinho. Para alcançar as 11 letras necessárias, o artista recorreu a duas soluções criativas: usou Jonas e Joel, em que o “J” tem som de “I”, e acrescentou o “I” de Isaías em homenagem à mãe, Izabel, escravizada pelo arquiteto Manoel Francisco Lisboa.

Aleijadinho concebeu assim um conjunto singular de 12 profetas: quatro Maiores, sete Menores e um Escriba, Baruc (do hebraico Berk-yah, “louvado”), já que não existia profeta com inicial “L”. A escolha reforça a força simbólica do ciclo escultórico de Congonhas.

Aleijadinho se mostrou visionário, indo além da alegoria e da religiosidade terrena, antecipando conceitos de criação e transcendência. Com seu cinzel, deixou gravados estados da alma humana, retratando a dor, a fé e a resistência. Sua mensagem, ainda hoje, desafia a razão: só quem possui sensibilidade espiritual pode compreender plenamente o alcance de sua obra.

Um grito de libertação: independência ou morte!

Aleijadinho foi comparado a Tomás Antônio Gonzaga, autor das Cartas Chilenas sob o pseudônimo Critilo. Ambos foram perseguidos, oprimidos e movidos por um profundo desejo de libertação, refletindo os ideais da Inconfidência Mineira. Essa ligação se reforça pelo conhecimento que Aleijadinho possuía da Escola Maçônica, perceptível em detalhes de suas arquiteturas, nos gestos dos Profetas e nos elementos das indumentárias esculpidas.

Aleijadinho, sem medo da profanação ou de castigos, concebeu o Adro do Santuário do Bom Jesus de Matosinhos como um lamento coletivo. Ali, os peregrinos se apresentam arrependidos, trazendo à pedra-sabão seus pecados e sofrimentos. As esculturas parecem ouvir e compartilhar da dor humana, ao mesmo tempo em que impõem advertências através do colóquio silencioso dos Profetas.

Aleijadinho, vivendo entre a dor física e a vitalidade da fé, encontrou no Absoluto a força do Verbo, transformando a palavra em “passagem” — transição e revelação. Com os 12 Profetas (1+2=3, número associado ao triângulo, a primeira figura perfeita), somou a si mesmo como o 13º elemento, símbolo da inteligência unida à Unidade, capaz de purificar o negativo e anunciar um novo ciclo: a Ressurreição.

Aleijadinho deixou à humanidade mais do que esculturas ou símbolos barrocos. Sua obra guarda sinais da tradição mística, ecos da Cabala e mensagens de transcendência espiritual. Dois séculos depois, ainda podemos compreender em Congonhas o eco de seu maior legado: o grito de libertação — Independência ou Morte!

Aleijadinho: se uma invenção, e daí?

Aleijadinho foi colocado em debate pelo pesquisador Dalton Sala, que questiona a autoria das esculturas atribuídas a Antônio Francisco Lisboa. Mais do que firmar polêmica, interessa aqui refletir sobre outro ângulo: a autonomia da arte e sua relação com a verdade.

Aleijadinho, assim como qualquer artista, é envolto por versões e interpretações. Positivistas dizem que contra fatos não há argumentos; jornalistas afirmam que versões são mais importantes que os fatos; já os semiólogos defendem que, acima de ambos, está a interpretação. Quando se trata de arte, é essa última vertente que parece prevalecer.

Aleijadinho nos lembra que a arte não pode ser reduzida à lógica do mundo. A obra artística desliza no tempo e no espaço em liberdade, sempre aberta a novas leituras. Assim como uma tragédia grega continua a dialogar com a contemporaneidade, também as esculturas de Congonhas seguem vivas, independentemente de quem as tenha assinado. A “fofoca histórica” sobre a autoria pouco altera o valor estético que carregam.

Aleijadinho, ou quem quer que tenha sido o autor material das esculturas, transmitiu em Congonhas uma visão barroca profunda, feita de dores, tensões, contradições e beleza. O impacto da obra independe da comprovação documental da autoria, porque sua força está na criação artística e não na propriedade do nome.

Aleijadinho também nos conduz a refletir que, em tempos passados, a autoria era secundária. A noção moderna de autoria nasceu da lógica burguesa, movida por interesses patrimoniais e de eternidade. Mas a obra de Congonhas está acima dessas contaminações: ela se sustenta por si mesma, como arte absoluta.

Aleijadinho, portanto, permanece intocado por curiosidades menores, disputas de gabinete ou versões mesquinhas. Sua obra resiste como criação estética perene, recusando o olhar torto que busca apenas a confirmação autoral. É nesse lugar — na liberdade da arte — que reside seu verdadeiro e imortal interesse.

Ivo Lucchesi

Produção Artística

Aleijadinho tinha mais de sessenta anos quando realizou em Congonhas do Campo suas obras-primas: as estátuas em pedra-sabão dos 12 Profetas (1800–1805), no adro da igreja, e as 66 figuras em cedro que compõem os Passos da Via Crucis (1796), no Santuário de Nosso Senhor Bom Jesus de Matosinhos.

Aleijadinho concebeu o Santuário do Bom Jesus como um conjunto único, em que arquitetura e escultura dialogam. No adro da igreja, as esculturas dos Profetas — Isaías, Jeremias, Baruc, Ezequiel, Daniel, Oséias, Jonas, Joel, Abdias, Habacuc, Amós e Naum — foram talhadas em pedra-sabão e dispostas em posições distintas, com gestos expressivos que sugerem movimento e diálogo entre si. O efeito para o observador é o de uma cena viva, reforçando o impacto espiritual e artístico do espaço.

Aleijadinho também estruturou a ladeira em frente à igreja com seis capelas, três de cada lado, conhecidas como os Passos da Paixão de Cristo. Em cada capela, grupos de esculturas em tamanho natural narram os momentos da Paixão, criando uma experiência de fé e arte que integra paisagem, arquitetura e devoção popular.

Aleijadinho produziu toda sua obra em Minas Gerais e, além desses dois conjuntos monumentais, recebeu inúmeras encomendas em vida, demonstrando a grande admiração que despertava. No entanto, com o tempo, seu nome caiu no esquecimento, sendo recuperado apenas em 1858, quando Rodrigo Bretas publicou sua biografia. O reconhecimento crítico, contudo, só se consolidou após a Semana de Arte Moderna de 1922, no contexto da valorização do barroco como expressão nacional.

Aleijadinho, progressivamente debilitado pela doença, acabou se isolando, convivendo apenas com dois escravizados que também eram seus ajudantes. Nos últimos anos perdeu a visão e ficou impossibilitado de trabalhar. Morreu em 1814, em Vila Rica, na casa da nora, encerrando uma trajetória marcada pela dor, mas imortalizada pela grandiosidade de sua arte.

Aleijadinho e a Arte Barroca

Aleijadinho foi um dos principais expoentes do barroco brasileiro, estilo que se manifestou na Europa Ocidental e na América Latina entre a metade do século XVI e o final do século XVII. A arte barroca é monumental, rica em detalhes dramáticos, e no século XVIII evoluiu para uma forma menos elaborada conhecida como Rococó.

Aleijadinho integrou tradições artísticas que se formaram a partir de três elementos culturais centrais da Europa Ocidental. Primeiro, os artistas reagiram à arte renascentista, contida e pautada pela harmonia, simplicidade e equilíbrio simétrico, criando formas mais dramáticas e rebuscadas. Enquanto arquitetos renascentistas utilizavam elementos retangulares para alcançar a perfeição, os barrocos exploraram linhas curvas e movimentos sinuosos, buscando maior expressividade.

Em segundo lugar, soberanos europeus desejavam um estilo que exaltasse seus reinos. Palácios como Versalhes, na França, e o Zwinger, na Alemanha, demonstraram poder e autoridade por meio da monumentalidade barroca, influenciando de maneira indireta o ambiente artístico das colônias.

O terceiro elemento foi a Contra-Reforma, que, nos séculos XVI e XVII, gerou um sentimento de exaltação religiosa em diversas regiões da Europa. Igrejas barrocas traduzem o drama e a emoção desse movimento, influenciando diretamente a iconografia e a dramaticidade presentes na obra de Aleijadinho.

Aleijadinho, trabalhando no Brasil do século XVIII, incorporou essa tradição europeia ao contexto colonial. A adoção do barroco no país esteve ligada à exploração das minas e à riqueza acumulada por uma elite local. O apoio de paróquias, confrarias e associações religiosas consolidou o barroco brasileiro como a primeira expressão artística nacional, permitindo a Aleijadinho desenvolver um estilo singular que unia monumentalidade, emoção e devoção religiosa.

Principais Obras do Aleijadinho

Em Ouro Preto

Igreja de São Francisco de Assis (risco geral, risco e esculturas da portada, risco da tribuna do altar-mor e dos altares laterais, esculturas dos púlpitos, do barrete, do retábulo e da capela-mor);

Igreja de Nossa Senhora do Carmo (modificações no frontispício e projeto original, esculturas da sobre porta e do lavatório da sacristia, da tarja do arco-cruzeiro, altares laterais de são João Batista e de Nossa Senhora da Piedade);

Igreja das Mercês e Perdões ou Mercês de Baixo (risco da capela-mor, imagens de roca de são Pedro Nolasco e são Raimundo Nonato);

Igreja São Francisco de Paula (imagem do padroeiro);

Igreja de Nossa Senhora da Conceição de Antônio Dias (quatro suportes de essa);

Igreja de São José (risco da capela-mor, da torre e do retábulo);

Igreja de Nosso Senhor Bom Jesus de Matosinhos ou de São Miguel e Almas (estátua de são Miguel Arcanjo e demais esculturas no frontispício);

Igreja de Nossa Senhora do Rosário (imagem de santa Helena); e as imagens de são Jorge, de Nossa Senhora, de Cristo na coluna e quatro figuras de presépio hoje no Museu da Inconfidência.

Em Congonhas

Igreja matriz (risco e escultura da sobre porta, risco do coro, imagem de são Joaquim).

Em Mariana

Chafariz da Samaritana.

Em Sabará

Igreja de Nossa Senhora do Carmo (risco do frontispício, ornatos da porta e da empena, dois púlpitos, dois atlantes do coro, imagens de são Simão Stock e de são João da Cruz).

Em São João del-Rei

Igreja de São Francisco de Assis (risco geral, esculturas da portada, risco do retábulo da capela-mor, altares colaterais, imagens de são João Evangelista);

Igreja de Nossa Senhora do Carmo (risco original frontispício e execução da maioria das esculturas da portada).

Em Tiradentes

Matriz de Santo Antônio (risco do frontispício).

Críticas

"Como arquiteto e ornamentista, o Aleijadinho trouxe o galardão supremo ao barroco português. Como escultor, se erigiu formas grandiosas das quais a civilização portuguesa não oferecia nenhum equivalente, não foi por espírito de revolução, mas, ao contrário, pelo despertar das forças criadoras que dariam à civilização luso-brasileira o grande artista-poeta que, depois de Nuno Gonçalves, ela não soube mais produzir".
Germain Bazin
BAZIN, Germain. O Aleijadinho e a escultura barroca no Brasil. 2. ed. rev. aum. Rio de Janeiro: Record, 1963. p. 111.

"O Brasil deu nele o seu maior engenho artístico, eu creio. Uma grande manifestação humana. A função histórica dele é vasta e curiosa. No meio daquele enxame de valores plásticos e musicais do tempo, de muito superior a todos como genialidade, ele coroava uma vida de três séculos coloniais. Era de todos, o único que se poderá dizer nacional, pela originalidade das suas soluções. Era já um produto da terra, e do homem vivendo nela, e era um inconsciente de outras existências melhores de além-mar: um aclimado, na extensão psicológica do termo. Mas, engenho já nacional, era o maior boato-falso da nacionalidade, ao mesmo tempo que caracterizava toda a falsificação da nossa entidade civilizada, feita não de desenvolvimento interno, natural, que vai do centro pra periferia e se torna excêntrica por expansão, mas de importações acomodatícias e irregulares, artificial, vinda do exterior. De fato Antônio Francisco Lisboa profetizava para a nacionalidade um gênio plástico que os Almeida Juniores posteriores, tão raros! são insuficientes pra confirmar.
Por outro lado, ele coroa, como gênio maior, o período em que a entidade brasileira age sob a influência de Portugal. É a solução brasileira da Colônia. É o mestiço e é logicamente a independência".
Mário de Andrade
[Texto escrito originalmente em 1928 e publicado no livro O Aleijadinho e Álvares de Azevedo. Rio de Janeiro: R. A. Editora, 1935.].
ANDRADE, MÁRIO DE. Aspectos das artes plásticas no Brasil. 3. ed. Belo Horizonte: Itatiaia, 1984. p. 41 (Obras completas de Mário de Andrade, 12).

"Antônio Francisco Lisboa nasceu em 29 de agosto de 1730, no arrabalde desta cidade, que se denomina O Bom Sucesso, pertencente à freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Antônio Dias. Filho natural de Manuel Francisco da Costa Lisboa, distinto arquiteto português, teve por mãe uma africana ou crioula de nome Isabel, escrava do mesmo Lisboa, que o libertou por ocasião de fazê-lo batizar.

Antônio Francisco Lisboa era pardo escuro, tinha voz forte, a fala arrebatada e o gênio agastado; a estatura era baixa, o corpo cheio e mal configurado, o rosto e a cabeça redondos, a testa volumosa, o cabelo preto e anelado, o da barba cerrado e basto, a testa larga, o nariz regular e algum tanto pontiagudo, os beiços grossos, as orelhas e o pescoço curto. Sabia ler e escrever e não consta que tivesse freqüentado alguma outra aula além da de primeiras letras, embora alguém julgue provável que tivesse frequentado a de latim.

O conhecimento que tinha do desenho, de arquitetura e escultura fora obtido na escola prática de seu pai e talvez na do desenhista João Gomes Batista, que, na Corte do Rio de Janeiro, recebera as lições do acreditado artista Vieira e era empregado como abridor de cunhos da Casa de Fundição de Ouro desta capital. Depois de muitos anos de trabalho, tanto nesta cidade como fora dela, sob as vistas e risco de seu pai, que até então era tido na província como o primeiro arquiteto, encetou Antônio Francisco Lisboa a sua carreira de mestre de arquitetura e escultura e nesta qualidade excedeu a todos os artistas deste gênero que existiram no seu tempo.

Até a idade de 47 anos, em que teve um filho natural ao qual deu o mesmo nome de seu pai, passou a vida no exercício de sua arte, cuidando sempre em ter boa mesa, e no gozo de perfeita saúde; e tanto que era visto muitas vezes tomando parte nas danças vulgares. De 1777 em diante, as moléstias provindas talvez em grande parte de excessos venéreos começaram a atacá-lo fortemente. Pretendem uns que ele sofrera mal epidêmico que sob o nome de zamparina pouco antes havia grassado nesta província, e cujos resíduos, quando o doente não sucumbia, eram quase infalíveis deformidades e paralisias: e outros que nele se havia complicado o humor gálico com o escorbútico. O certo é que ou por ter negligenciado a cura do mal no seu começo, ou pela força invencível do mesmo, Antônio Francisco perdeu todos os dedos dos pés, do que resultou não poder andar senão de joelhos; os das mãos atrofiaram-se e curvaram e mesmo chegaram a cair, restando-lhe somente, ainda assim quase sem movimento, os polegares e os índices. As fortíssimas dores que de contínuo sofria nos dedos e a acrimônia do seu humor colérico o levavam por vezes ao excesso de cortá-los ele próprio, servindo-se do formão com que trabalhava".
Rodrigo José Ferreira Bretas
[Texto escrito originalmente em 1858 e publicado no Correio Oficial de Minas, nos números 169 e 170, com o título Traços biográficos relativos ao finado Antônio Francisco Lisboa, distinto escultor mineiro, mais conhecido pelo apelido de Aleijadinho.].
BARBOSA, Waldemar de Almeida. O Aleijadinho de Vila Rica. São Paulo: Edusp; Belo Horizonte: Itatiaia, 1988. 94 p. (Reconquista do Brasil. 3. Série especial, 1).

"A contradição fundamental entre o estilo da época - elegante e amaneirado - e o ímpeto poderoso do seu temperamento apaixonado e tantas vezes místico, contradição magistralmente superada, mas latente e que, por isso, de quando em quando extravasava - é a marca indelével da sua obra, o que lhe dá o tom singular, e faz deste brasileiro das Minas Gerais a mais alta expressão individualizada da arte portuguesa do seu tempo. Deve-se, aliás, assinalar que essa modalidade mineira de arte colonial portuguesa no Brasil apresenta, por vezes, maior afinidade com o barroco-rococó de entre o Danúbio e os Alpes do que com a arte metropolitana que a gerou.
A religiosidade do Aleijadinho cresceu na medida do seu íntimo convívio com a hagiografia e com a Bíblia; e do isolamento a que se impôs, em consequência da moléstia, resultou uma profunda comunhão de sua arte com a fé. As inúmeras sentenças e os versículos que participam da composição dos púlpitos e retábulos de sua autoria se devem, indubitavelmente, à sua própria iniciativa e escolha, porquanto não ocorrem na obra de nenhum outro entalhador".
Lucio Costa
COSTA, Lúcio. Antônio Francisco Lisboa, o "Aleijadinho". In: O UNIVERSO mágico do barroco brasileiro. São Paulo: Sesi, 1998. p. 169.

"Embora tenha feito seu aprendizado básico na área da escultura de relevos ornamentais, sob direção do português João Gomes Batista, formado por sua vez em Lisboa com o artista francês Antoine Mengin, o Aleijadinho (1735-1814) deixou também obras importantes no campo da estatuária monumental e imaginária sacra, daí advindo grande parte de sua reputação de principal artista brasileiro do período colonial. Em duas de suas portadas, as das igrejas de São João Batista de Barão de Cocais e São Miguel e Almas de Ouro Preto, figuram nichos com estátuas de santos padroeiros em pedra-sabão. Executadas cerca de trinta anos antes do conjunto dos doze Profetas do Santuário de Congonhas, do período de 1800-1805, essas estátuas oferecem uma boa base comparativa para análise da evolução estilística do Aleijadinho, do naturalismo e movimentação contida e algo desajeitada, da primeira fase de sua carreira, à estilização e libertação das formas no espaço, na fase final.
Já idoso e praticamente entrevado pela doença que lhe valeu o apelido, o artista teve numerosos auxiliares nesta monumental obra de Congonhas, mencionados nos seus recibos anuais com o título de 'oficiais', segundo a tradição medieval, ainda mantida na organização social do trabalho na era colonial. Desta colaboração resultaram deformações de caráter diverso, perceptíveis a uma análise mais atenta, mas que desaparecem quando o espectador se coloca no ponto de vista ideal para a visão do conjunto, ou seja, frontalmente, a cerca de 5 metros do portão de acesso. Este indício revela algo do sistema de divisão de trabalho em vigor na 'oficina' do Aleijadinho, que reservara para si as partes mais importantes e mais claramente visíveis das estátuas, assim como seu conhecimento de um dos aspectos fundamentais da estética barroca, a intencionalidade teatral".
Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira
OLIVEIRA, Myriam Andrade Ribeiro de. Escultura no Brasil colonial. In: O UNIVERSO mágico do barroco brasileiro. São Paulo: Sesi, 1998. p. 131.

Acervos

Acervo Banco Itaú S.A. - São Paulo SP
Capela da Ordem Terceira de São Francisco de Assis - São João del Rei MG
Igreja da Assunção de Nossa Senhora - Mariana MG
Igreja da Ordem Terceira de São Francisco de Assis - São João del Rei MG
Igreja da Ordem Terceira do Carmo - Ouro Preto MG
Igreja de Nossa Senhora das Mercês e Perdões - Ouro Preto MG
Igreja de Nossa Senhora do Carmo - Ouro Preto MG
Igreja de Nossa Senhora do Pilar - Ouro Preto MG
Igreja de São Francisco de Assis - Ouro Preto MG
Igreja do Carmo - Sabará MG
Igreja do Rosário - Santa Rita Durão MG
Igreja Matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso - Caeté MG
Matriz de Santo Antônio - Tiradentes MG
Matriz de São João Batista - Barão de Cocais MG
Santuário do Bom Jesus de Matosinhos - Congonhas do Campo MG

Exposições Póstumas

1961 - São Paulo SP - Barroco no Brasil, no MAB/Faap
1978 - Rio de Janeiro RJ - Individual, no MAM/RJ
1979 - Belo Horizonte MG - 6º Salão Global de Inverno, na Fundação Clóvis Salgado
1984 - São Paulo SP - Tradição e Ruptura: síntese de arte e cultura brasileiras, na Fundação Bienal
1988 - São Paulo SP - A Mão Afro-Brasileira, no MAM/SP
1997 - Brasília DF - Herança Barroca, no Palácio Itamaraty
1997 - São Paulo SP - Herança Barroca, no MAB/Faap
1998 - São Paulo SP - 24ª Bienal Internacional de São Paulo, na Fundação Bienal
1998 - São Paulo SP - O Universo Mágico do Barroco, na Galeria de Arte do Sesi
1999 - Paris (França) - Brésil Baroque: entre ciel et terre, no Musée des Beaux-Arts de la Ville de Paris
2000 - Rio de Janeiro RJ - Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho: o que vemos e o que sabemos, no MNBA
2000 - Rio de Janeiro RJ - Brasil + 500 Mostra do Redescobrimento. Arte Barroca, no MNBA
2000 - São Paulo SP - Brasil + 500 Mostra do Redescobrimento, na Fundação Bienal
2000 - São Paulo SP - Coleção Renato Whitaker, no Restaurante Antiquários
2001 - Itu SP - Aleijadinho: o que vemos e o que sabemos
2001 - Nova York (Estados Unidos) - Brazil: body and soul, no Solomon R. Guggenheim Museum
2001 - São Paulo SP - Museu de Arte Brasileira: 40 anos, no MAB/Faap
2002 - Rio de Janeiro RJ - Arte Brasileira na Coleção Fadel: da inquietação do moderno à autonomia da linguagem, no CCBB
2002 - Rio de Janeiro RJ - Barroco no Museu Nacional de Belas Artes, no MNBA
2002 - Salvador BA - O Aleijadinho, no Museu de Arte Sacra
2002 - São Paulo SP - Aleijadinho e Mestre Piranga: imagens da Coleção Renato Whitaker, na Pinacoteca do Estado
2002 - São Paulo SP - Arte Brasileira na Coleção Fadel: da inquietação do moderno à autonomia da linguagem, no CCBB
2003 - Brasília DF - Arte Brasileira na Coleção Fadel: da inquietação do moderno à autonomia da linguagem, no CCBB
2003 - São Paulo SP - Tomie Ohtake na Trama Espiritual da Arte Brasileira, no Instituto Tomie Ohtake
2004 - Rio de Janeiro RJ - Tomie Ohtake na Trama Espiritual da Arte Brasileira, no MNBA

Fonte: CidadesHistoricas, Congonhas.caldeira.adv.br, Aleijadinho.com, Sampa.art.br, Itaú Cultural

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