Yuri Firmeza

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Biografia

Yuri Firmeza 

Em seus vídeos, performances e fotografias Yuri Firmeza pressiona os limites entre a ficção, o possível e o real. De maneira crítica e irônica, o artista ocupa espaços inabitáveis, cria imagens insólitas, forja relações precárias e assim questiona as relações de poder no circuito de arte e na sociedade contemporânea. Entre suas principais exposições e bolsas, destacam-se Bolsa Pampulha (Museu de Arte da Pampulha, Belo Horizonte, 2008), Laços do Olhar (Instituto Tomie Ohtake, São Paulo, 2008), Olhar Aguçado (Alpendre, Fortaleza, 2007), Artista Invasor (Museu de Arte Contemporânea, Fortaleza, 2006), 5º Salão Nacional de Arte de Goiás (Espaço Flamboyant, Goiânia, 2005) e 6º Salão Sobral (Sobral, 2003).

Entrevista

Yuri desnuda a alma e o moletom por Natércia Pontes, Revista Aldeota

Íntegra da entrevista feita por Natércia Pontes originalmente publicada na Revista Aldeota em 27 de maio de 2010

O artista plástico Yuri Firmeza fala sobre políticas culturais, transitoriedade e zumbis.

Vestido de camisa branca e moletom puído, Yuri Firmeza recebe a gente no pequeno apartamento que divide com a tia, em um condomínio do Jardim Bonfiglioli — sua base na capital paulista.

Andarilho, Yuri tem medo de avião, mas vive viajando entre Fortaleza, São Paulo, Belo Horizonte, Lima, Rio de Janeiro, Buenos Aires, Curitiba etc. Suas andanças pelos céus de brigadeiro da América Latina têm uma justificativa: dar conta de um mestrado em Poéticas Visuais na USP, participar de projetos de residência, ministrar workshops mundo afora e figurar em exposições em museus da estirpe do MAM do Rio de Janeiro, do Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, do Nano Stockholm, na Suécia, do Centro Cultural de Belas Artes, no Peru e, mais uma vez, etc.

O artista cearense que criou em 2006 a persona nipônica de Souzousareta Geijutsuka, — e revelou que alguns jornalistas pagam pau pra gringo e mal acessam o Google, que dirá as fontes —, dorme em um quarto minúsculo apinhado de livros, dvd’s e móveis das Casas Bahia. Devido às dimensões enxutas do espaço, optamos por fazer a entrevista no playground.

O sol se punha quando sentamos no gira-gira colorido, ladeado por um escorregador e uma gangorra, sobre um chão de grama artificial. Um menininho com fuça de Peter Pan interrompia vez ou outra a entrevista com seus gritos. Além do rio Pinheiros, o clima onírico nos deixou à vontade para versar sobre clichês tão necessários, como a Morte e a Arte. De quebra, com a naturalidade de um performer setentista e sem medo de transgredir o que já foi transgredido, Yuri infringiu as normas de atentado ao pudor do condomínio e ficou nu.

Que sorte a sua chamar-se Yuri Firmeza. É um nome elegante, de artista. Se você se chamasse Wesley Pereira, por exemplo, usaria um pseudônimo?

(Risos) Ai, Natércia! Tem que pensar, né, cara... Wesley Pereira? Cara, que pergunta troncha! (Silêncio) É difícil responder porque...

Você não quer ofender os Wesleys?

(Mais risos) Não é isso, é porque já que não tenho esse nome, eu não tenho como me transportar ou me pensar no lugar desse nome, ou no lugar de Yuri Firmeza, mesmo. Ainda que muita gente ache que “Yuri Firmeza” seja um pseudônimo, mas é o meu sobrenome real, que eu uso como nome de artista. Mas, Wesley Pereira? Eu até gosto de Pereira e... ah, acho que, na verdade, eu não sei responder essa tua pergunta...

Você já respondeu! Como você descobriu que é artista?

Eu não sei bem o que é ser artista. Eu não sei em que momento começou, porque é algo tão imbricado com a própria vida, que não tem como descolar do momento que sou ou que não sou. Do ponto de vista da criação, é algo que vem sendo semeado há muito tempo. Quando eu era criança, já tinha uma afinidade com a criação, desde as brincadeiras até os cursos que fiz, de desenho, escultura, música... sempre gostei de fazer barulho. No ponto de vista da legitimação por um circuito de arte, isso vem ocorrendo há pouco tempo. Mas o artista legitimado não é necessariamente um artista legítimo. Tem um texto do Enrico (Rocha), um texto curto e bem bacana, que fala sobre isso.

Yuri, você acha que todos somos artistas ou só alguns são artistas?

Eu acho que ser artista é uma forma de se posicionar no mundo. É muito mais uma questão ética do que estética. Ser artista é mais do que criar. Existem artistas que são rotulados como artistas e a meu ver não são artistas. O artista que quer ser "artista", stricto sensu, tem que estar de alguma forma inserido no mercado de arte — no sentido de um status social. E quando quer ser artista muitas vezes é justamente o momento que deixa de ser artista. Eu não acredito que todos são artistas... O Andy Warhol disse que todo mundo terá seus quinze minutos de fama, eu acho que aí ele está falando de espetáculo, de mídia. E eu não entendo que ser artista é estar em evidência, dentro do métier. A meu ver o artista tem que romper com os paradigmas do que é ser artista.

Yuri, é mais difícil mentir ou dizer a verdade? O artista precisa mentir?

Pode soar muito clichê, mas penso que a estética, e a ética, estão para além do moralismo impregnados nessas — e por essas — duas palavras: mentira e verdade. Se estamos de acordo que o instinto moral é um hábito, e se concordarmos com a máxima de Mário Pedrosa, a arte como exercício experimental da liberdade, parece-me ficar claro que a arte e o artista se aproximam mais de operações contra as forças do hábito do que de debater-se contra esses termos gerais e caducos... o potencial da arte não é a mentira ou a verdade, é a invenção.

Você viaja muito, certo? Isso te atrapalha ou te ajuda a criar? As cidades são coadjuvantes ou simples cenários da tua narrativa?

Isso me ajuda e me atrapalha ao mesmo tempo. Me ajuda porque eu adoro estar em trânsito, porque eu acho que é uma oportunidade de me colocar como estrangeiro — no sentido da ingenuidade de um olhar investigatório que tateia, que busca essa imersão no estranhamento do lugar. É um espaço que não foi “cartografado”ainda e onde construo minhas referências nessa relação direta entre corpo e lugar. De outro modo, me sinto um pouco atrapalhado por essas viagens, porque às vezes elas são tão de passagem que é impossível estabelecer uma “conversa” com a cidade. E quando eu falo de lugar eu falo também de pessoas. Mas esse processo de “inventar uma cidade” não é propriamente vinculado com o tempo que passo nela. Às vezes eu fico um mês numa cidade e não estabeleço nenhum vínculo com o lugar e noutros casos em fração de segundos já “borrei” e fui “borrado” pelo lugar.

Você tem medo de parar de ser interessante ou de se interessar?

(Silêncio) Tenho mais medo de parar de me interessar. Até porque nem acho que sou interessante! Parar de se interessar é como viver morto. Tem tanta gente zumbi por aí, né?

Tem, mas você é bastante interessante. Você acha que a arte está para todos?

Bom, como falar isso sem soar arrogante? A arte é elitista, sempre foi. É feita por uma elite e infelizmente para uma elite. Não acredito que seja uma imagem caricata: é fato. Eu acho que a arte não tem interesse nenhum nesse discurso de arte para as massas, ela não pretende e nem deve ser demagógica. Mas eu acho que o acesso deva ser para todos, só que a partir de uma invenção do público. Não essa formação hipócrita de público que transforma o trabalho ‘mastigado’ dos artistas nesse discurso diluído para as massas, mas a invenção de um público que se dá principalmente pela educação. A demanda de um público não pode ser ponto de partida para a criação. Também acho que outras políticas culturais devem correr além das políticas de editais — para evitar que caiamos em um clientelismo. Ter acesso à arte não é só ter museu gratuito, mas inventar um público que alcance essa discussão e que esteja de fato envolvido. Tem um trabalho do Antoni Muntadas que resume bem o que quero dizer: “Atenção: percepção requer envolvimento”.

Você esvazia a cabeça entre um projeto e outro ou está sempre tendo idéias — e por isso fala tão rápida e articuladamente?

Lembrei uma história de que o Macalé havia surtado na época da Ditadura e ficou muito aflito porque não conseguia mais produzir. Aí ele fez umas sessões com a Lygia Clark, que disse pra ele: “Não lute contra seu silêncio. É o momento que você vai estar consigo, o momento de uma lacuna necessária para a criação, não lute contra nada”. Eu acho isso super lindo. Tenho silêncios enormes, brancos, que eu adoro. São momentos saudáveis de decantação do que já foi feito... Há épocas na vida que eu estou com quinze projetos e sou obrigado a pensar constantemente, numa espécie de tagarelice mental. Sou forçado a pensar por uma questão vital, por uma questão de vida ou morte. E assim sou reinventado constantemente.

Eu sei que você é amante do cinema. Conta o último filme bom que você viu.

Eu revi Alphaville do Godard, mas não vou falar dele porque dez mil pessoas já falaram...

Ah, tá. Você quer soar o mais entendido o possível, né?

(Risos) Não. Mas o último filme que eu vi mesmo, e revi pela sexta vez, foi “Acidente”, de Cao Guimarães e Pablo Lobato. O documentário feito no interior de Minas que, como um jogo de dados, constrói um poema através dos nomes dessas cidades que eles visitam. É um documentário, que é cinema, é vídeo-arte, é poesia, é tudo isso, mas não é nada disso porque implode essas categorias.

Você tem muito segredos? Diz pra mim o que você acha que acontece depois que a gente morre.

Eu tenho uns segredos que até eu desconheço. Mas trabalhos e amigos sempre acabam me revelando alguns deles ou fazem com que eu acabe inventando coisas que vão se tornar segredos. Ultimamente tenho feito umas experiências com sal grosso — dormindo com as mãos enfiadas em sacos de sal grosso — o que tem me colocado numas relações enigmáticas minhas com outros Yuris. Mas eu sou um cara transparente, eu não tenho muitos segredos, não. Agora sobre a morte... Eu acredito muito em energia, que quando se morre a gente passa a ser só energia, a gente entra em outra frequência, em outra dimensão.

Tomara que façam vernissage nessa outra dimensão, né?(Risos)

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