Christiano Stockler das Neves

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Biografia

Christiano Stockler das Neves (Casa Branca SP 1889 - São Paulo SP 1982)

Arquiteto e professor.

Ingressa no curso de engenheira e arquitetura da Escola Politécnica de São Paulo - Poli, em 1907. Insatisfeito, transfere-se para os Estados Unidos, decidido a estudar no Instituto de Belas Artes da Universidade da Pensilvânia. Incomum num período em que a Europa é a grande referência cultural, essa escolha, segundo alguns autores, é sugerida pelo engenheiro-arquiteto George Krug (1869 - 1919), tio de Anita Malfatti (1889 - 1964), formado naquele instituto, professor da Poli e colaborador no Escritório Técnico de Construções do engenheiro Samuel das Neves (1863 - 1937), pai de Christiano. É admitido no instituto, em 1909, após comprovar seu ingresso na Poli e realizar exames de proficiência de desenho à mão livre e história da arquitetura. Forma-se em 1911, e realiza uma viagem de seis meses pela Europa, considerada fundamental na formação dos arquitetos por proporcionar o contato direto com as capitais do velho mundo e seus monumentos.

Retorna ao Brasil em 1912, e integra-se ao escritório de seu pai, um dos mais prestigiados da capital paulista. Torna-se professor da Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Em 1915, apresenta para a direção da instituição a proposta de criação de uma faculdade de arquitetura nos moldes do instituto de belas-artes americano, onde estudara. No ano seguinte, é criado experimentalmente um departamento de arquitetura na Escola de Engenharia. Diante do sucesso da empreitada, o curso de engenheira e arquitetura é oficializado em 1917, e tem Neves como diretor. O curso é separado da Escola de Engenharia em 1947, com a criação da Faculdade de Arquitetura da Universidade Mackenzie. Neves permanece no cargo de diretor e professor de composição até 1957, quando se aposenta.

Em março de 1947, é indicado pelo governador de São Paulo, Adhemar de Barros (1901 - 1969), para o cargo de prefeito. Institui a Comissão do Plano Diretor e cria o Departamento de Arquitetura e a Companhia Municipal de Transportes Coletivos - CMTC. Poucas semanas após a criação da companhia, eleva o valor da tarifa, inalterado por 36 anos, gerando protestos tão intensos que é destituído do cargo em agosto do mesmo ano.

Participa ativamente da criação dos órgãos de representação de classe, entre eles o Instituto Central dos Arquitetos, em 1921, no Rio de Janeiro, do qual é sócio-fundador, e o Instituto Paulista de Arquitetos, em 1930, sob sua direção.

Em 1927, a Estação de Ferro Sorocabana, 1922, atual Estação Júlio Prestes - Sala São Paulo, com projeto de sua autoria, recebe o prêmio de honra do 3º Congresso Pan-Americano de Arquitetura, realizado em Buenos Aires. Em 1930, sua obra é recebe medalha de ouro no 4º Congresso Pan-Americano de Arquitetos, no Rio de Janeiro.

Comentário Crítico

Polemista contumaz, Christiano Stockler das Neves é figura de destaque entre as décadas de 1910 e 1950 na criação de cursos de arquitetura autônomos e na luta pela regulamentação profissional. Motivado pelas dificuldades de exercer a profissão no Brasil e pela baixa qualidade das construções, Neves propõe, em 1915, à Universidade Presbiteriana Mackenzie a criação de um curso de arquitetura, inspirado no Instituto de Belas Artes da Universidade da Pensilvânia, onde estudara. O instituto, assim como muitas escolas de arte e arquitetura da virada do século XIX para o século XX, tem como modelo a Escola de Belas Artes de Paris, conhecida como Ecole de Beaux-Arts, cujo ensino enfatiza as matérias artísticas e históricas em detrimento das matérias técnico-científicas. Para os arquitetos acadêmicos vinculados a esse modelo, como Neves, a arquitetura é uma disciplina eminentemente artística que tem como objetivo principal atingir a beleza pela recuperação das formas que a história da arquitetura consagra a cada tipologia.1 Interessa a esses arquitetos não a originalidade ou o ineditismo de seu projeto, mas o perfeito conhecimento da tipologia e dos estilos a ela vinculados, e a sua adaptação às necessidades da época. Daí a importância que as disciplinas de desenho à mão livre, história, teoria, elementos da arquitetura e composição têm no curso que propõe ao Mackenzie, oficializado em 1917, inicialmente como um departamento da Escola de Engenharia e, a partir de 1947, como uma Faculdade de Arquitetura independente.

A orientação de ensino da faculdade e a valorização de estilos vinculados à tradição clássica, como o Renascimento e o neoclassicismo francês - nomeados pelo arquiteto como Luís XVI modernizado -, estão presentes nos projetos que desenvolve entre os anos 1912 e 1940, e na série de artigos que publica em revistas especializadas como a Architectura e Construções e nos jornais O Correio Paulistano, O Estado de S. Paulo e O Diário, este último do Rio de Janeiro.

Nesses artigos defende o estilo Luís XVI modernizado como o símbolo de civilização e progresso a ser adotado pela nação, criticando a campanha de arte tradicional liderada por Ricardo Severo (1869 - 1940), em São Paulo, e José Marianno Filho (1881 - 1946), no Rio de Janeiro,2 por considerar a arquitetura colonial uma manifestação artística de pouco ou nenhum valor. Em outro conjunto de artigos contrapõe-se aos preceitos básicos do movimento moderno,3 afirmando que os projetos "futuristas" de Frank Lloyd Wright (1867 - 1959), Le Corbusier (1887 - 1965), Gregori Warchavchik (1896 - 1972), Lucio Costa (1902 - 1998), entre outros, por se aterem apenas à utilidade, funcionalidade e estandardização da construção não podem ser considerados propriamente arquitetura. Antimodernista convicto, Neves trava uma verdadeira batalha contra esses arquitetos dentro e fora da faculdade, tendo como interlocutores, além dos arquitetos já citados, os escritores Oswald de Andrade (1890 - 1954) e Mário de Andrade (1893 - 1945) e, sobretudo, seus alunos, entre eles Eduardo Kneese de Mello (1906 - 1994), Oswaldo Bratke (1907 - 1997), Miguel Forte (1915 - 2002), Salvador Candia (1924 - 1991), Carlos Lemos (1925), Carlos Millan (1927 - 1964) e Paulo Mendes da Rocha (1928), que juntamente com os professores adeptos do movimento moderno conseguem afastá-lo do cargo em 1957.

Nos projetos que desenvolve nesse período, de fato predomina a referência à arquitetura neoclássica francesa, tal como fora interpretada pelos norte-americanos, e a Estação da Estrada de Ferro Sorocabana, 1922/1938 (atual Estação Júlio Prestes - Sala São Paulo) é o exemplo mais marcante da monumentalidade e solidez almejadas por Neves em seus projetos. Além do aspecto estilístico, chama atenção a grande quantidade de projetos desenvolvidos para edifícios comerciais e de escritórios que empregam uma técnica que é, anos depois, muito cara aos arquitetos modernos paulistas: o concreto armado. São exemplos dessas novas construções os edifícios Riachuelo, ca.1917, e Sampaio Moreira, 1923/1937, cuja aprovação é dificultada pelo então diretor de obras municipais, o engenheiro Victor da Silva Freire (1869 - 1951), temeroso de que esse arranha-céu de inspiração norte-americana desvirtuasse o perfil europeu que a cidade adquire no fim do século XIX, o que de fato ocorre.

De todas as polêmicas em que se envolve, a mais recorrente, cujos resultados são sentidos até hoje, diz respeito à defesa dos direitos dos arquitetos. Defensor ferrenho da autoria e do respeito às definições de projeto, Neves renega a autoria de algumas de suas obras alteradas durante a construção - como a Estação Sorocabana e o Ministério da Guerra, 1939 -, rescinde contratos e tem pouco de seus projetos efetivamente realizados. O que importa destacar, contudo, é a sua preocupação em distinguir a atividade do arquiteto da do engenheiro, projetista, desenhista e mestre-de-obras, seu empenho em criar uma faculdade de arquitetura independente, constituir órgãos de classe, como o Instituto Central de Arquitetos e o Instituto Paulista de Arquitetos, e regulamentar o exercício profissional, escrevendo artigos, conferências e palestras em que defende veementemente que ao arquiteto, e só a ele, cabe o desenvolvimento de projetos e a fiscalização da obra.4

Notas
1 As tipologias na tradição acadêmica são definidas pelo programa ou usos do edifício, de forma que existiriam estilos apropriados para edifícios públicos, teatros, hospitais etc. Conceito de architecture parlante.
2 NEVES, Christiano Stockler das. Architectura colonial. Revista de Engenharia, n. 22, p. 50-60, republicado no Jornal do Comércio de São Paulo, São Paulo,  24 abr. 1917.
3 ______. A pretensa architectura moderna. Revista Architectura e Construções, n. 1, v. I, 08/1929, p. 15-19; ______. A Architectura e o Futurismo. Revista Architectura e Construções, n. 9, v. I, 4/1930, p. 3-4; ______. O "buff" architectônico: as teorias do arch. Frank Lloyd Wright, as machinas de habitar, o caso da Escola de Bellas Artes, Revista Architectura e Construções, 11/1931, p. 1-7.
4 ______. O que é architectura. Revista Architectura e Construções, n. 4, v. I, 1929, p. 5-9; ______. Architectura e engenharia: considerações sobre o recente Congresso de Architectos. Revista Architectura e Construções, 12/1930; ______. O arquiteto e o engenheiro. Revista de Engenharia do Mackenzie, n. 85, abr. 1944; ______. Conferências proferidas nos 3º e 4º Congressos Pan-Americanos de Architectos, 1927 e 1930.

Fonte: Itaú Cultural

Veja também