Arthur Bispo do Rosário

Obras de arte disponíveis

No momento não possuimos obras de Arthur Bispo do Rosário em nosso acervo.
Você possui uma obra deste artista e quer vender?
Clique aqui e envie sua obra para avaliação.

Biografia

Arthur Bispo do Rosário (Japaratuba SE 19111 - Rio de Janeiro RJ 1989)

Artista visual.

Em 1925, muda-se para o Rio de Janeiro, onde trabalha na Marinha Brasileira e na companhia de eletricidade Light. Em 1938, após um delírio místico, apresenta-se a um mosteiro que o envia para o Hospital dos Alienados na Praia Vermelha. Diagnosticado como esquizofrênico-paranóico, é internado na Colônia Juliano Moreira, no bairro de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Entre 1940 e 1960, alterna os momentos no hospício e períodos em que exerce alguns ofícios em residências cariocas. No começo da década de 1960, trabalha na Clínica Pediátrica Amiu, onde vive em um quartinho no sótão. Ali, inicia seus trabalhos, realizando com materiais rudimentares diversas miniaturas, como de navios de guerra ou automóveis, e vários bordados. Em 1964, regressa à Colônia, onde permanece até a sua morte. Cria por volta de 1.000 peças com objetos do cotidiano, como roupas e lençóis bordados. Em 1980, uma matéria de Samuel Wainer Filho para o programa Fantástico, da TV Globo, revela a produção de Bispo. Dois anos depois, o crítico de arte Frederico Morais inclui suas obras na exposição À Margem da Vida, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro - MAM/RJ. O artista tem sido enfocado em filmes de curta e média-metragens; em livros, como Arthur Bispo do Rosário: o Senhor do Labirinto, de Luciana Hidalgo; e ainda em peças teatrais. Em 1989, é fundada a Associação dos Artistas da Colônia Juliano Moreira, que visa à preservação de sua obra, tombada em 1992 pelo Instituto Estadual do Patrimônio Artístico e Cultural - Inepac. Sua produção está reunida no Museu Bispo do Rosário, denominado anteriormente Museu Nise da Silveira, localizado na antiga Colônia Juliano Moreira.

Comentário Crítico

O passado de Arthur Bispo do Rosário é praticamente desconhecido. Sabe-se apenas que era negro, marinheiro, pugilista, lavador de ônibus e guarda-costas. Nas vésperas do Natal de 1938 é internado no Hospital Nacional dos Alienados, na Praia Vermelha, no Rio de Janeiro, após um delírio místico. Com diagnóstico de paranóico-esquizofrênico, é transferido no ano seguinte para a Colônia Juliano Moreira, em Jacarepaguá. Entre muitas permanências e saídas, vive mais de 40 anos na instituição, onde executa a maior parte de sua obra.

Os trabalhos de Bispo diversificam-se entre justaposições de objetos e bordados. Nos primeiros, utiliza geralmente utensílios do cotidiano da Colônia, como canecas de alumínio, botões, colheres, madeira de caixas de fruta, garrafas de plástico, calçados; e materiais comprados por ele ou pessoas amigas. Para os bordados usa os tecidos disponíveis, como lençóis ou roupas, e consegue os fios desfiando o uniforme azul de interno. Prepara, com seus trabalhos, uma espécie de inventário do mundo para o dia do Juízo Final. Nesse dia se apresentaria a Deus, com um manto especial, como representante dos homens e das coisas existentes. O manto bordado traz o nome das pessoas conhecidas, para não se esquecer de interceder junto a Deus por elas. Bispo faz também estandartes, fardões, faixas de miss, fichários, entre outros, nos quais borda desenhos, nomes de pessoas e lugares, frases com respeito a notícias de jornal ou episódios bíblicos, reunindo-os em uma espécie de cartografia. A criação das peças, para ele, é uma tarefa imposta por vozes que dizia ouvir.

No início da década de 1980, com as questões levantadas pela arte contemporânea com a antipsiquiatria e as novas teorias sobre a loucura, os trabalhos de Bispo começam a ser valorizados e integrados ao circuito de arte. Em 1980, uma reportagem do Fantástico, da TV Globo, sobre a situação da Colônia Juliano Moreira, mostra suas obras, agrupadas no quartinho em que vive. No mesmo ano, o psicanalista e fotógrafo Hugo Denizart (1946) realiza o filme O Prisioneiro da Passagem - Arthur Bispo do Rosário. Com a divulgação, veio o reconhecimento artístico das obras, que contribui para sua participação, em 1982, na mostra À Margem da Vida, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro - MAM/RJ, com trabalhos de presidiários, menores infratores, idosos e internos da Colônia. Posteriormente é realizada sua primeira exposição individual, também no MAM/RJ. O crítico de arte Frederico Morais escreve sobre seu trabalho, ligando-o à arte de vanguarda, à arte pop, ao novo realismo e especialmente à obra de Marcel Duchamp (1887 - 1968).

Em 1995, com uma vasta seleção de peças, Bispo representa o Brasil na Bienal de Veneza e obtém reconhecimento internacional. Sua obra torna-se uma das referências para as gerações de artistas brasileiros dos anos 1980 e 1990.

Notas
1 Segundo registros da Light, onde trabalha entre 1933 e 1937, nasce em 16 de março de 1911. Nos registros da Marinha de Guerra do Brasil, onde serve entre 1925 e 1933, consta 14 de maio de 1909.

Críticas

"Muito já se escreveu sobre a 'produção artística' realizada no confinamento dos asilos e manicômios, ou a dos outsiders, marginais do circuito das artes plásticas e do sistema da Cultura, sem, contudo, conferir-lhe um papel na História da Arte, porque esta produção desliza para outras significações. O esforço tem sido no sentido de determinar-lhes uma categoria - art brut, arte incomum, singuliers de l'art - posto que revelam a criatividade em estado puro, sem nenhuma sistematização ou disciplina, (...). Entretanto, o interesse na obra de Bispo reside no conjunto da produção com o seu método de trabalho, que consiste em uma metáfora romântica sobre ser artista: ele, no interior de sua cela, desfiava seus uniformes de interno para obter fios azuis desbotados com os quais bordava sua cartografia, mumificava os objetos do seu cotidiano. O artista desnuda-se, despoja-se para dar existência à obra, assinalando a transitoriedade do corpo em oposição à permanência do trabalho".
Ivo Mesquita
MESQUITA, Ivo. Arthur Bispo do Rosário. GALERIA: revista de arte, São Paulo, n. 17, p. 122, 1989.

"As assemblages reúnem objetos geralmente industrializados, produzidos em série, ligados ao consumo e à cultura de massa. Em cada painel uma linha de objetos: canecas de alumínio, botões, garrafas de plástico com papel picado, ferragens, sabonetes, colheres, sapatos, botas de borracha, material elétrico e eletrônico, objetos rituais (macumba). Às vezes os objetos localizados num mesmo suporte diferem entre si, mas as texturas e os materiais se assemelham. Vistas em conjunto, essas acumulações fazem lembrar um bazar ou loja de ferragens. São como mostruários e, não por acaso, Bispo denominava-as 'vitrines'. (...)
Reuniu também em suportes precários objetos de madeira nua, às vezes com rala mão de cal, que lembram as merzbilders de Schwitters. Objetos isolados, duchampianos, eu diria, de decifração ainda difícil, com forte carga simbólica, ou simples ente de encantadores, como estas pequenas caixas na qual papéis recortados e multicoloridos são como notas musicais".
Frederico Morais
MORAIS, Frederico. A reconstrução do universo segundo Arthur Bispo do Rosário. In: ARTHUR Bispo do Rosário:registros de minha passagem pela terra. Belo Horizonte: Museu de Arte, 1990. p. 21, 24.

"A extrema originalidade que reveste a obra desses criadores é fruto de vários fatores: a quase ausência de formação acadêmica, a soltura em relação ao espírito do tempo, o afastamento do convívio social, etc. Nessa solidão ontológica reside a certeza de Fernando Diniz quando transforma em arte velhos lençóis, ou a determinação de Bispo do Rosario ao reunir objetos banais na Colônia Juliano Moreira - um dos depósitos terminais de seres humanos na trajetória das internações psiquiátricas -, transformando-os em instalações surpreendentes. (...) Um ser que não teve ateliê, nem incentivo por parte do meio, construiu uma obra impulsionado por seu interior, de uma extrema contemporaneidade, rompendo e pondo em questão os próprios meios de que a arte se faz".
Luiz Carlos Mello
MELLO, Luiz Carlos. Flores do abismo. In: MOSTRA DO REDESCOBRIMENTO, 2000, SÃO PAULO. Imagens do inconsciente. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo: Associação Brasil 500 anos Artes Visuais, 2000. p. 43.

"Se é um manto ou não, pode parecer uma questão sem importância. Não obstante, a designação 'manto' encobre a natureza do arquétipo social sobre a qual Bispo do Rosário elaborou. Esta obra nasce da imitação de uma peça do vestuário da nobreza: parte da roupa de um rei, ou de um general do exército real. Só o paletó interessa, pois nele se concentram os elementos simbólicos ostentatórios de poder e nobreza, como dragonas, bordados, condecorações. (...) o que temos aqui é a apropriação pelo artista de um objeto-símbolo que a seus olhos traduz riqueza, beleza, nobreza, (...).
Vista desse ângulo, esta obra de Bispo do Rosário é, como expressão artística, uma manifestação surpreendente por sua originalidade e força semântica".
Ferreira Gullar
GULLAR, Ferreira. Relâmpagos: dizer o ver. São Paulo: Cosac & Naify, 2003.

Depoimentos

"HUGO: Como você veio parar aqui neste hospital?

BISPO: Em 22 de dezembro desci lá, em São Clemente, Botafogo, no fundo duma casa dessa, quando fui reconhecido pela família. No dia seguinte, depois, me apresentei no Mosteiro de São Bento, dia 24. Dia 24 eu vim aqui para viver, né? Mandado pelos frades.

HUGO: Pelos frades?

BISPO: É, reconheceram a mim. Eu disse assim: eu vim para julgar os vivos e os mortos. Eles perceberam  e mandaram eu vir para o hospício. Que antes mesmo, eu lá na Ilha do Governador (...) já dizia que vinha para o hospício a fim de julgar os vivos e os mortos. Isso pra quem enxerga, quem conhece. Um médico, por exemplo, que é psiquiatra, eu quando cheguei na Praia Vermelha, com dois dias fui chamado por uma junta médica. Dr. Odilon Galotti. Tinha uma junta médica a fim de me interrogar e todos eles perceberam que eu tinha vindo representar a sua santidade. Dentro dessa santidade, me permitiam uma casa forte. A casa forte pertence a Cristo e assim eu passei a residir na casa forte, a fim de fazer miniaturas, porque eles perceberam a minha visão.
(...)
HUGO: Essa transformação que você está sofrendo. . .

BISPO: Minha apresentação ao mundo. Eu devo estar pronto daqui a uns seis ou cinco meses (...) com ação, resplendor, dos pés à cabeça, a fim de me apresentar ao mundo. Dentro dessa representação aqui.

HUGO: E como vai ser essa representação?

BISPO: Eu vou estancar e apresentar o resplendor a fim da representação do mundo. E quem deve me apresentar são os interessados aqui da Colônia que, segundo a habitação de Cristo, diz: eu, do hospício, devo apresentar minha transformação aos diretores. Mais nada.

HUGO: Aos diretores?

BISPO: É, aos diretores, eles não ficam aqui? Só quem pode me apresentar são eles. Isso aqui foi feito pra eles. Só pra eles. Mais nada.
(...) Igual a essas miniaturas que eu fiz, permite a minha transformação.
HUGO: As miniaturas permitem a sua transformação?

BISPO: Pois é.

HUGO: Como é que permite?

BISPO: Não tem a representação? Vou me apresentar corporalmente. Minha ação corporal é esse brilho que botei.

HUGO: E essas miniaturas são representações.

BISPO: É material existente na terra dos homens.

HUGO: É uma representação de tudo que existe na terra?

BISPO: É, são trabalhos que existem.

HUGO: E você vai se transformar em Jesus Cristo, como é que é?

BISPO: Não vou me transformar não, rapaz, você está falando com ele. Tá mais do que visto. Mas pra quem enxerga, para quem não enxerga não dá pé".

Arthur Bispo do Rosário em entrevista a Hugo Denizart

HIDALGO, Luciana. "Os anjos vão abrindo a formosa fina pluma espuma esponja por onde sai o verbo estrondo". In: _______. Arthur Bispo do Rosário:o senhor do labirinto. Rio de Janeiro: Rocco, 1996. p. 136, 137, 139.

Exposições Coletivas

1982 - Rio de Janeiro RJ - À Margem da Vida, no MAM/RJ

Exposições Póstumas

1989 - Rio de Janeiro RJ - Registros de Minha Passagem pela Terra, na EAV/Parque Lage
1990 - Belo Horizonte MG - Registros de Minha Passagem pela Terra, no Museu de Arte da Pampulha
1990 - Porto Alegre RS - Registros de Minha Passagem pela Terra, no Museu de Arte do Rio Grande do Sul Ado Malagoli
1990 - São Paulo SP - Registros de Minha Passagem pela Terra, no MAC/USP
1991 - Estocolmo (Suécia) - Viva Brasil Viva, no Kulturhuset, Konstavdelningen och Liljevalchs Konsthall - sala especial
1992 - Rio de Janeiro RJ - Reciclo, na Fundação Nacional de Arte. Centro de Artes
1992 - Rio de Janeiro RJ - Transformando e Recriando os Restos: o lixo passado a limpo, no Paço Imperial
1993 - Rio de Janeiro RJ - Arthur Bispo do Rosario: inventário do universo, no MAM/RJ
1994 - Rio de Janeiro RJ - Bispo do Rosário, na Galeria Ibeu Copacabana
1994 - Rio de Janeiro RJ - Bispo do Rosário, na Galeria Ibeu Madureira
1995 - Veneza (Itália) - 46ª Bienal de Veneza
1996 - Rio de Janeiro RJ - O Navegante, no MNBA
1997 - Cidade do México (México) - Así Está la Cosa: instalación y arte objeto en America Latina, no Centro Cultural Arte Contemporáneo
1998 - Brasília DF - Eu Preciso Destas Palavras. Escrita. , na CEF
1999 - São Paulo SP - Cotidiano/Arte. Objeto Anos 90, no Itaú Cultural
1999 - São Paulo SP - Por que Duchamp?, no Paço das Artes
1999 - São Paulo SP - Transcendências: caixas do ser, na Casa das Rosas
1999 - Vitória ES - Eu Vim, na Universidade Federal. Galeria de Arte Espaço Universitário
2000 - Rio de Janeiro RJ - Brasil + 500 Mostra do Redescobrimento. Imagens do Inconsciente, no Paço Imperial
2000 - Rio de Janeiro RJ - Brasilidades, no Centro Cultural Light
2000 - São Paulo SP - Brasil + 500 Mostra do Redescobrimento. Imagens do Inconsciente, na Fundação Bienal
2001 - Nova York (Estados Unidos) - Brazil: body and soul, no Solomon R. Guggenheim Museum
2002 - São Paulo SP - Ópera Aberta: celebração, na Casa das Rosas
2003 - Paris (França) - La Clé des Champs et Arthur Bispo do Rosario, na Galerie Nationale du Jeu de Paume
2003 - Rio de Janeiro RJ - Arte em Movimento, no Espaço BNDES
2003 - Rio de Janeiro RJ - Bandeiras do Brasil, no Museu da República
2003 - São Paulo SP - Ordenação e Vertigem, no CCBB
2004 - São Paulo SP - Brasileiro, Brasileiros, no Museu Afro-Brasil

Fonte: Itaú Cultural

Veja também